A isoporização da cana-de-açúcar pode ser entendida como um processo de desidratação do colmo que ocorre do centro para a periferia de cana e de cima para baixo da cana, tornando-o com coloração branca e com aspecto isoporizada. Com esta desidratação a cana perde peso, ficando menos densa e mais fibrosa. O principal causador do processo de isoporização cana de açúcar é o florescimento das plantas, já que as flores drenam grande quantidade de água e ainda retiram açúcares do colmo, prejudicando a qualidade da cana para efeitos de industrialização. São três os principais fatores que causam o florescimento: fotoperíodo (tempo de exposição à luz solar); temperatura e umidade do solo. Tais fatores deixam claro que o florescimento e a isoporização da cana ocorrem por fatores não controláveis e que além de provocar perdas de açúcares, e consequentemente de produção de açúcar e de etanol, prejudica ainda a colheita mecanizada por tornar as canas mais rígidas e ainda a extração dos açúcares, seja por moenda ou difusor, por deixar os colmos mais fibrosos e esponjosos. O presente trabalho foi realizado em uma usina localizada no estado de Goiás – Brasil, e teve como objetivos desenvolver uma metodologia de quantificação do grau de isoporização, determinação da densidade das canas e os impactos na extração do caldo por difusor a partir dos dados de qualidade.
Palavras-chaves: cana-de-açúcar, isoporização, florescimento, difusão.
Celso Silva Caldas*
Leandro Aparecido Cândido**
Luana Xavier Tavares dos Santos**
Josiana Cruz do Nascimento**
Warley Vieira Tavares**
* Prof. Titular do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Alagoas
** Grupo ATVOS
INTRODUÇÃO
A isoporização da cana é resultado de um processo de desidratação dos tecidos nos colmos, que ao perderem água adquirem uma coloração branca e aspecto isoporizado. Este fenômeno é iniciado nas partes internas do colmo, evoluindo para periferia da cana e da ponta da planta para sua base. Alguns técnicos chamam este processo de chochamento da cana, vez que que a isoporização baixa a densidade da cana, podendo afetar a produtividade agrícola da cana (CAPUTO et al., 2007).
Atrelada à isoporização, ocorre o florescimento da cana, principalmente nas variedades mais sensíveis. Neste fenômeno ocorre a emissão da panícula em condições favoráveis, aumentando ainda mais o processo de isoporização da cana e diminuindo a quantidade de açúcares na cana. Segundo Araldi et al (2010) três fatores favorecem o florescimento da cana:
· Fotoperíodo, que é quantidade de radiação solar durante o dia em relação à noite.
· Redução das temperaturas do ar: temperaturas noturnas abaixo de 18ºC por períodos maiores de 10 dias e diurnas abaixo de 31ºC.
· Umidade adequada do solo.
· Fevereiro a março na região centro-sul do Brasil
· Janeiro a março na região nordeste brasileiro. Além do florescimento, outros fatores isolados ou em conjunto podem ainda contribuir para a isoporização da cana: (a) déficit hídrico, (b) pragas, (c) doenças, (d) déficit nutricional, etc. Vale destacar que alguns autores afirmam que é possível que a cana não floresça, mas apresente elevado grau de isoporização.
Segundo Ruiz (2014), estima-se que nas variedades floríferas colhidas em meio e final de safra que não tenham o florescimento inibido com o uso de maturadores. Ainda segundo o autor a perda de água do colmo, contudo, não implica necessariamente na perda de açúcar, pois a sacarose fica armazenado nos colmos. Avaliações de diversos experimentos indicaram que a pol na cana continuou sem alteração com o tempo, mesmo com a presença de “isoporização” a níveis de 20-60% dos internódios (BARBIERI & SILVA, 2011). Por outro lado, aumentos nos teores de fibra, açúcares redutores e acidez apenas foram verificados nos casos em que o diâmetro da área isoporizada ultrapassou 50 % do diâmetro do colmo (SILVA NETO et al., 2011). Finalmente, o nível de isoporização parece interferir na perda de qualidade, e somente em intensa isoporização do colmo é que se verifica redução drástica na qualidade do caldo. A redução do volume de caldo resultante do aumento do teor de fibras que aumentam também a produção de bagaço (ARALDI et al., 2010).
Nas avaliações industriais sobre o impacto da cana isoporizada no processo de extração do caldo, observa-se que durante a percolação dentro do difusor, a formação do colchão de cana desfibrada demonstra uma flutuação anormal, indicando densidade baixa da matéria prima. Esse fator, trabalhando com colchão de cana de 1,5 m, impossibilita o trabalho normal de embebição fibra entre 300% e 400%.
Nota-se ainda que um preparo muito fino provoca uma percolação lenta, mesmo operando com aplicação do caldo aquecido nas calhas 1 e 2, como recomendado na operação do difusor. Com isso, retira-se a embebição devido à má percolação e como consequência temos a baixa extração.
Na extração do caldo por moendas registra-se que a isoporização pode também acarretar prejuízos na embebição, baixar a densidade do bagaço, apresentar fibras curtas que dificulta a “pega” da moenda. Tudo isto leva a obtenção de um caldo com baixa transparência e presença de bagacilho em suspensão (MARQUES et al., 2008). Além disso, há interferência na pesagem já que a densidade da cana se torna menor. Finalmente, no pagamento pela qualidade da matéria prima há interferência em função do aumento do AR, fibra e redução do teor de sacarose (Peixoto et al., 1983. Citados por Tasso Júnior et al, 2009).
Sob esse cenário, foram levantados dados sobre amostragem e análise de canas em florescimento e com isoporização, realizada na Unidade Água Emendada, tendo como objetivo avaliar os aspectos da matéria prima entregue e impacto nas perdas industriais durante processo de extração do caldo. Para isso, a metodologia utilizada foi baseada nos trabalhos “Características Varietais em Florescimento e Isoporização – Atualização” (LADEL, 2014) e “Fisiologia e sua Aplicação sobre Florescimento e Isoporização da Cana-de-Açúcar” (MUTTON, 2013), adaptados ao cenário do Laboratório de Cana da unidade.
OBJETIVOS
· Avaliar e quantificar o impacto negativo no processo de extração do caldo por difusão
· Relacionar as perdas na extração com a eficiência geral industrial
MATERIAIS E MÉTODOS
As amostras usadas neste estudo foram de cana-de-açúcar que apresentavam floração coletadas no dia 10/08/2023 na fazenda 14, talhões 01 e 17, de uma Unidade Industrial do Grupo ATVOS, localizada no estado de Goiás
– Brasil. Na figura 01 é possível observar uma das amostras, evidenciando o florescimento da cana.
Para determinação do grau de isoporização, expresso em percentagem massa/massa (%mm), inicialmente as canas foram medidas inteiras, em metro, conforme apresentado na tabela 01. Na sequência as canas foram despontadas e medidos os tamanhos dos palmitos e, por fim, da cana limpa.
Na sequência foram dados cortes nos colmos limpos das amostras até que eles não mais apresentassem pontos e partes brancas características do processo de isoporização, como pode ser observado na figura 02. Todas as partes isoporizadas e sem apresentar branqueamento dos colmos foram medidas e determinada o percentual, ou grau de isoporização, da seguinte maneira:
Grau de Isoporização (%mm) = 100 x cana isoporizada / cana sadia
FIGURA 02 – Toletes com colmos apresentando isoporização
Para validar as previsões de impactos negativos nas eficiências de extração por difusores, neste estudo foram ainda determinadas as densidades das canas sadias e isoporizadas. Para isto foram realizados ensaios para com amostras de cana com tamanhos de 10cm, devidamente pesados em balança analítica e imersos em provetas de 1000mL com exatos 800mL de água. Foram considerados como volumes das amostras as quantidades de água deslocadas, e assim determinadas as densidades pela expressão:
Densidade (g/mL) = massa da cana / volume da cana
Com objetivo de avaliar o impacto negativo da isoporização na qualidade da cana, foram realizadas análises dos parâmetros de qualidade de acordo com o Sistema de Pagamento de Cana normatizado através do CONSECANA SP (2015).
Finalmente, com os dados observados foram realizados cálculos comparativos da eficiência de extração usando os dados reais de cana e de bagaço, e da Pol%Cana (PC) das canas sadias e totalmente isoporizadas.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Usando a metodologia de separação dos pedaços de canas sadia e totalmente isoporizadas, pudemos admitir que nas amostras analisadas o grau de isoporização médio foi de 60,9%. O presente estudo foi restrito à poucas amostras, mas ficou evidente que tal metodologia pode se estender a amostras de várias fazendas e talhões, dando assim um número mais real e representativo de como está o canavial em relação ao processo de isoporização.
Na tabela 01 estão apresentadas todas as medições das canas, com o percentual de isoporização ao final.
TABELA 01 – Determinação do Grau de Isoporização (%mm)
No que se refere à qualidade de cana, após a separação das canas sadia e isoporizada foi possível determinar os vários parâmetros de qualidade de acordo com o Sistema CONSECANA. Os objetivos nestes testes foram observar o impacto negativo da isoporização nos dados de açúcares totais recuperáveis – ATR, e ainda nos açúcares redutores totais – ART e nas pol % cana – PC. Pelos dados obtidos apresentados na tabela 03, indica uma perda de 10,92 % no valor do ATR, podendo com este dado estimar financeiramente o impacto do processo da isoporização no valor da tonelada de cana.
Finalmente, foram realizadas simulações de cálculos para avaliar o impacto negativo na eficiência de extração da Unidade Industrial que usa um difusor para extração do caldo. Para cálculo da eficiência de extração foi usada a equação adotada na imensa maioria das usinas, ou seja, pela relação POL/FIBRA da cana e do bagaço. Nestes cálculos os dados de bagaço não foram alterados, mas as relações POL/FIBRA das canas foram de acordo com a classificação real (cana moída); isoporizada e sadia (sem isoporização). Lembramos que para tais simulações foi adotada a metodologia deste estudo na separação de canas sadias e isoporizadas. Assim, as diferenças obtidas entre eficiências de extrações das canas sadias e as totalmente isoporizadas foram calculadas e a média semanal ficou em 0,57 %, ou seja, esse é o percentual que impactada negativamente a cana isoporizada na eficiência de extração de difusores.
REFERÊNCIAS
MUTTON, Miguel Angelo. Fisiologia e sua Aplicação Sobre Florescimento e Isoporização da Cana-de-açúcar. Sertãozinho, São Paulo, 113 p., fevereiro 2013.
GOMES, Maria. Isoporização da cana: o que é e quais são os prejuízos para a produtividade. SENSIX BLOG. 2022. Disponível em: https: //blog. mettzer. com/ referencia-de-sites-e-artigos-nline/#:~ :text=peri% C3%B3dica%20 com% 20autor- SOBRENOME%2C%20Nome.,Dispon% C3% ADvel% 20em% 3A%20 URL.. Acesso em: 10 agosto. 2023.
DEDINE. Manual de Operação: Difusor MDB. Piracicaba, Julho 2009, 49p.
ARALDI, R.; SILVA, F.M.L.; ONO, E.O.; RODRIGUES, J.D. Florescimento em cana-de-açúcar. Ciência Rural, v. 40, p. 694-702, 2010.
BARBIERI, V.; SILVA, F.C. Efeito do florescimento na brotaçao e perfilhamento da cana-de-açúcar (Saccharum spp.). Bioenergia em revista: diálogos. p.118-128. 2011.
CAPUTO, M. M.; SILVA, M. A.; BEAUCLAIR, E. G. F.; GAVA, G. J. C.Acúmulo de sacarose, produtividade e florescimento de cana-de-açúcar sob reguladores vegetais. Interciência, v.32, n.12, p.834-840. 2007.
RUIZ, L. Aumentando o ATR e diminuindo o florescimento. v. Cana Online. Nº15. p. 55-63, 2014.
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