CTC acha para você

Pesquisa personalizada

Resultados da Pesquisa

terça-feira, 5 de dezembro de 2023

CANA ISOPORIZADA – MÉTODO DE QUANTIFICAÇÃO E IMPACTO NA DIFUSÃO

 A isoporização da cana-de-açúcar pode ser entendida como um processo de desidratação do colmo que ocorre do centro para a periferia de cana e de cima para baixo da cana, tornando-o com coloração branca e com aspecto isoporizada. Com esta desidratação a cana perde peso, ficando menos densa e mais fibrosa. O principal causador do processo de isoporização cana de açúcar é o florescimento das plantas, já que as flores drenam grande quantidade de água e ainda retiram açúcares do colmo, prejudicando a qualidade da cana para efeitos de industrialização. São três os principais fatores que causam o florescimento: fotoperíodo (tempo de exposição à luz solar); temperatura e umidade do solo. Tais fatores deixam claro que o florescimento e a isoporização da cana ocorrem por fatores não controláveis e que além de provocar perdas de açúcares, e consequentemente de produção de açúcar e de etanol, prejudica ainda a colheita mecanizada por tornar as canas mais rígidas e ainda a extração dos açúcares, seja por moenda ou difusor, por deixar os colmos mais fibrosos e esponjosos. O presente trabalho foi realizado em uma usina localizada no estado de Goiás – Brasil, e teve como objetivos desenvolver uma metodologia de quantificação do grau de isoporização, determinação da densidade das canas e os impactos na extração do caldo por difusor a partir dos dados de qualidade.

Palavras-chaves: cana-de-açúcar, isoporização, florescimento, difusão.

Celso Silva Caldas*

Leandro Aparecido Cândido**

Luana Xavier Tavares dos Santos** 

Josiana Cruz do Nascimento**

Warley Vieira Tavares**

* Prof. Titular do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Alagoas

** Grupo ATVOS

INTRODUÇÃO

A isoporização da cana é resultado de um processo de desidratação dos tecidos nos colmos, que ao perderem água adquirem uma coloração branca e aspecto isoporizado. Este fenômeno é iniciado nas partes internas do colmo, evoluindo para periferia da cana e da ponta da planta para sua base. Alguns técnicos chamam este processo de chochamento da cana, vez que que a isoporização baixa a densidade da cana, podendo afetar a produtividade agrícola da cana (CAPUTO et al., 2007).  

Atrelada à isoporização, ocorre o florescimento da cana, principalmente nas variedades mais sensíveis. Neste fenômeno ocorre a emissão da panícula em condições favoráveis, aumentando ainda mais o processo de isoporização da cana e diminuindo a quantidade de açúcares na cana. Segundo Araldi et al (2010) três fatores favorecem o florescimento da cana:

·         Fotoperíodo, que é quantidade de radiação solar durante o dia em relação à noite.

·         Redução das temperaturas do ar: temperaturas noturnas abaixo de 18ºC por períodos maiores de 10 dias e diurnas abaixo de 31ºC.

·         Umidade adequada do solo.

 A latitude da área onde está o canavial pode influenciar estes fatores, de maneira geral o florescimento dos canaviais no Brasil é favorecido nos seguintes períodos (ARALDI et al., 2010):

·         Fevereiro a março na região centro-sul do Brasil

·         Janeiro a março na região nordeste brasileiro. Além do florescimento, outros fatores isolados ou em conjunto podem ainda contribuir para a isoporização da cana: (a) déficit hídrico, (b) pragas, (c) doenças, (d) déficit nutricional, etc. Vale destacar que alguns autores afirmam que é possível que a cana não floresça, mas apresente elevado grau de  isoporização.

Segundo Ruiz (2014), estima-se que nas variedades floríferas colhidas em meio e final de safra que não tenham o florescimento inibido com o uso de maturadores. Ainda segundo o autor a perda de água do colmo, contudo, não implica necessariamente na perda de açúcar, pois a sacarose fica armazenado nos colmos. Avaliações de diversos experimentos indicaram que a pol na cana continuou sem alteração com o tempo, mesmo com a presença de “isoporização” a níveis de 20-60% dos internódios (BARBIERI & SILVA, 2011).  Por outro lado, aumentos nos teores de fibra, açúcares redutores e acidez apenas foram verificados nos casos em que o diâmetro da área isoporizada ultrapassou 50 % do diâmetro do colmo (SILVA NETO et al., 2011).  Finalmente, o nível de isoporização parece interferir na perda de qualidade, e somente em intensa isoporização do colmo é que se verifica redução drástica na qualidade do caldo.  A redução do volume de caldo resultante do aumento do teor de fibras que aumentam também a produção de bagaço (ARALDI et al., 2010). 

Nas avaliações industriais sobre o impacto da cana isoporizada no processo de extração do caldo, observa-se que durante a percolação dentro do difusor, a formação do colchão de cana desfibrada demonstra uma flutuação anormal, indicando densidade baixa da matéria prima. Esse fator, trabalhando com colchão de cana de 1,5 m, impossibilita o trabalho normal de embebição fibra entre 300% e 400%.

Nota-se ainda que um preparo muito fino provoca uma percolação lenta, mesmo operando com aplicação do caldo aquecido nas calhas 1 e 2, como recomendado na operação do difusor. Com isso, retira-se a embebição devido à percolação e como consequência temos a baixa extração.

Na extração do caldo por moendas registra-se que a isoporização pode também acarretar prejuízos na embebição, baixar a densidade do bagaço, apresentar fibras curtas que dificulta a “pega” da moenda. Tudo isto leva a obtenção de um caldo com baixa transparência e presença de bagacilho em suspensão (MARQUES et al., 2008). Além disso, interferência na pesagem que a densidade da cana se torna menor. Finalmente, no pagamento pela qualidade da matéria prima interferência em função do aumento do AR, fibra e redução do teor de sacarose (Peixoto et al., 1983. Citados por Tasso Júnior et al, 2009).

Sob esse cenário, foram levantados dados sobre amostragem e análise de canas em florescimento e com isoporização, realizada na Unidade Água Emendada, tendo como objetivo avaliar os aspectos da matéria prima entregue e impacto nas perdas industriais durante processo de extração do caldo. Para isso, a metodologia utilizada foi baseada nos trabalhos “Características Varietais em Florescimento e Isoporização – Atualização” (LADEL, 2014) e “Fisiologia e sua Aplicação sobre Florescimento e Isoporização da Cana-de-Açúcar” (MUTTON, 2013), adaptados ao cenário do Laboratório de Cana da unidade.

OBJETIVOS

 ·         Definir uma metodologia para quantificação do grau de isoporização

·         Avaliar e quantificar o impacto negativo no processo de extração do caldo por difusão

·         Relacionar as perdas na extração com a eficiência geral industrial

MATERIAIS E MÉTODOS

As amostras usadas neste estudo foram de cana-de-açúcar que apresentavam floração coletadas no dia 10/08/2023 na fazenda 14, talhões 01 e 17, de uma Unidade Industrial do Grupo ATVOS, localizada no estado de Goiás

– Brasil. Na figura 01 é possível observar uma das amostras, evidenciando o florescimento da cana.



 FIGURA 01 – Ilustração de uma amostra de cana com florescimento

Para determinação do grau de isoporização, expresso em percentagem massa/massa (%mm), inicialmente as canas foram medidas inteiras, em metro, conforme apresentado na tabela 01. Na sequência as canas foram despontadas e medidos os tamanhos dos palmitos e, por fim, da cana limpa.

Na sequência foram dados cortes nos colmos limpos das amostras até que eles não mais apresentassem pontos e partes brancas características do processo de isoporização, como pode ser observado na figura 02. Todas as partes isoporizadas e sem apresentar branqueamento dos colmos foram medidas e determinada o percentual, ou grau de isoporização, da seguinte maneira:

Grau de Isoporização (%mm) = 100 x cana isoporizada / cana sadia



FIGURA 02 Toletes com colmos apresentando isoporização

Para validar as previsões de impactos negativos nas eficiências de extração por difusores, neste estudo foram ainda determinadas as densidades das canas sadias e isoporizadas. Para isto foram realizados ensaios para com amostras de cana com tamanhos de 10cm, devidamente pesados em balança analítica e imersos em provetas de 1000mL com exatos 800mL de água. Foram considerados como volumes das amostras as quantidades de água deslocadas, e assim determinadas as densidades pela expressão:

Densidade (g/mL) = massa da cana / volume da cana

Com objetivo de avaliar o impacto negativo da isoporização na qualidade da cana, foram realizadas análises dos parâmetros de qualidade de acordo com o Sistema de Pagamento de Cana normatizado através do CONSECANA SP (2015).

Finalmente, com os dados observados foram realizados cálculos comparativos da eficiência de extração usando os dados reais de cana e de bagaço, e da Pol%Cana (PC) das canas sadias e totalmente isoporizadas.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Usando a metodologia de separação dos pedaços de canas sadia e totalmente isoporizadas, pudemos admitir que nas amostras analisadas o grau de isoporização médio foi de 60,9%. O presente estudo foi restrito à poucas amostras, mas ficou evidente que tal metodologia pode se estender a amostras de várias fazendas e talhões, dando assim um número mais real e representativo de como está o canavial em relação ao processo de isoporização.

Na tabela 01 estão apresentadas todas as medições das canas, com o percentual de isoporização ao final.

TABELA 01 Determinação do Grau de Isoporização (%mm)


Ainda considerando esta proposta de metodologia para quantificar o grau de isoporização, será possível criar níveis de isoporização de uma área de cana como, por exemplo, BAIXO, MÉDIO, ALTO e ELEVADO.

Uma das consequências da isoporização é a queda da densidade da cana, fato este que compromete mais a extração do caldo por difusão do que por moenda, pois a tendência é que as canas fiquem mais na superfície do colhão de cana, prejudicando a lixiviação do caldo. Ou seja, a isoporização da cana prejudica mais a extração de usinas que usam difusores em relação às extrações por ternos de moendas. Os dados obtidos e mostrados na tabela 02 indicam que a isoporização nas amostras estudadas provocou uma perda de 28,24% na densidade da cana, favorecendo a flutuação dessas canas dentro do difusor e prejudicando a lixiviação para extração dos açúcares.

TABELA 02 Determinação da densidade de cana sadia e isoporiza


No que se refere à qualidade de cana, após a separação das canas sadia e isoporizada foi possível determinar os vários parâmetros de qualidade de acordo com o Sistema CONSECANA. Os objetivos nestes testes foram observar o impacto negativo da isoporização nos dados de açúcares totais recuperáveis – ATR, e ainda nos açúcares redutores totais – ART e nas pol % cana – PC. Pelos dados obtidos apresentados na tabela 03, indica uma perda de 10,92 % no valor do ATR, podendo com este dado estimar financeiramente o impacto do processo da isoporização no valor da tonelada de cana.

TABELA 03 Parâmetros de qualidade de canas sadia e isoporizada


Finalmente, foram realizadas simulações de cálculos para avaliar o impacto negativo na eficiência de extração da Unidade Industrial que usa um difusor para extração do caldo. Para cálculo da eficiência de extração foi usada a equação adotada na imensa maioria das usinas, ou seja, pela relação POL/FIBRA da cana e do bagaço. Nestes cálculos os dados de bagaço não foram alterados, mas as relações POL/FIBRA das canas foram de acordo com a classificação real (cana moída); isoporizada e sadia (sem isoporização). Lembramos que para tais simulações foi adotada a metodologia deste estudo na separação de canas sadias e isoporizadas. Assim, as diferenças obtidas entre eficiências de extrações das canas sadias e as totalmente isoporizadas foram calculadas e a média semanal ficou em 0,57 %, ou seja, esse é o percentual que impactada negativamente a cana isoporizada na eficiência de extração de difusores.

TABELA 04 Cálculos das eficiências de extração de cana moída, isoporizada e sadia


CONCLUSÕES

Concluídos os testes com estas canas isoporizadas, podemos resumidamente concluir que:
·         A quantidade de canas isoporizadas representam em média de 60,8 % porcento do total da cana;
·         A isoporização representa uma diminuição da densidade da cana na ordem de 28 %, certamente sendo o principal motivo de queda na eficiência de extração por difusão em função de aumentar a flutuação da cana isoporizada no colchão dentro do difusor, prejudicando percolação e lixiviação;
·         Nos parâmetros de qualidade de cana a isoporização provocou uma queda de 10,92 % no valor de ATR, justamente porque o florescimento drena a sacarose e outros açúcares para as flores, diminuindo os açúcares no colmo;
·         Simulações dos cálculos de eficiência de extração em uma semana de moagem, mas usando a metodologia de separação de cana sadia e isoporizada, mostrou uma queda de 0,57 %, lembrando que a Extração % Pol (Real) demonstra um cenário com baixa embebição, gerando um delta entre Extração Real x Extração Cana Isoporizada (Simulada);
·         Usando as metodologias apresentadas neste estudo é possível conhecer com mais representatividade o nível de isoporização do canavial, ajudando com isto a validar flutuações nos valores de eficiência de extração em difusores.

REFERÊNCIAS

 LANDELL, Marcos Guimarães de Andrade. Características Varietais em Florescimento e Isoporização - Atualização. Instituto Agronômico /APTA/SAA - SP, São Paulo, 103 p., 2014.

MUTTON, Miguel Angelo. Fisiologia e sua Aplicação Sobre Florescimento e Isoporização da Cana-de-açúcar. Sertãozinho, São Paulo, 113 p., fevereiro 2013.

GOMES, Maria. Isoporização da cana: o que é e quais são os prejuízos para a produtividade. SENSIX BLOG. 2022. Disponível em: https: //blog. mettzer. com/ referencia-de-sites-e-artigos-nline/#:~ :text=peri% C3%B3dica%20 com% 20autor- SOBRENOME%2C%20Nome.,Dispon% C3% ADvel% 20em% 3A%20 URL.. Acesso em: 10 agosto. 2023.

DEDINE. Manual de Operação: Difusor MDB. Piracicaba, Julho 2009, 49p.

ARALDI, R.; SILVA, F.M.L.; ONO, E.O.; RODRIGUES, J.D. Florescimento em cana-de-açúcar. Ciência Rural, v. 40, p. 694-702, 2010.

BARBIERI, V.; SILVA, F.C. Efeito do florescimento na brotaçao e perfilhamento da cana-de-açúcar (Saccharum spp.). Bioenergia em revista: diálogos. p.118-128. 2011.  

CAPUTO, M. M.; SILVA, M. A.; BEAUCLAIR, E. G. F.; GAVA, G. J. C.Acúmulo de sacarose, produtividade e florescimento de cana-de-açúcar sob reguladores vegetais. Interciência, v.32, n.12, p.834-840. 2007. 

RUIZ, L. Aumentando o ATR e diminuindo o florescimento. v. Cana Online. Nº15. p. 55-63, 2014.

Nenhum comentário:

Postar um comentário